quarta-feira, julho 24, 2013

Ilhas




Isolamento, confinamento e solidão são as primeiras coisas que me vem à cabeça quando penso em Ilhas. 
A idéia de ter que escolher tres livros ou tres discos para passar o resto da vida me soa muito esquisita.
Qual sentido disso ? 
Dar conforto ao sujeito que escolhe (com todo cuidado do mundo!) Amoroso do João Gilberto, Psychocandy do Jesus and Mary Chain e o Astral Weeks do Van Morrison como companhia para o resto da vida ?
O Camarada vai lá e faz o exercício completo, dedilha sua coleção, disco a disco, avalia qual deles aguentaria a dureza do tempo.
Pesa quanto vale cada memória que os acordes desenterram dos lugares mais obscuros da sua cachola e mede os arrepios por região do corpo.
Todo esse envolvimento para que ?
Caso voce se encontre solitário numa ilha qualquer de sonho, é melhor aprender a batucar se quiser música.
Nem pensar em energia elétrica. Muito menos em aparelhinhos que possam precisar de qualquer coisa que não seja a luz do sol.
Ou teria a ilha deserta dos nossos sonhos energia eletrica, ar condicionado, um belo home theather para assistir os benditos e preciosos tres filmes, geladeira com provisão inesgotável de cerveja para acompanhar o pôr do sol...
Olha que não seria má idéia.
Internet tambem não faria mal algum, pois não ?
A velha lenda do surfista que ficou à deriva em alguma ilha com ondas perfeitas sempre acaba com a loucura absoluta do pobre coitado.
É como a anedota do náufrago que salva a vida da Sharon Stone e não encontra ninguem para contar.
Ilhas servem perfeitamente para metáfora, ninguem é uma ilha, disse o poeta.
Um amigo diz que ilhéu geralmente tem uma visão do mundo muito limitada e usou os australianos como exemplo de gente que não enxerga além do umbigo.
Toda generalização é tão perigosa quanto tentadora.
Os australianos são os primeiros a admitir isso com a frase, Famoso na Austrália, famoso no resto do mundo.
A maneira como o povo da Madeira reagiu quando estrangeiros (inclusive portugueses) quiseram impedir o "progresso" da ilha e salvar uma das melhores ondas que tinham é outro exemplo.
O lado negro das ilhas que não aparece nas fotos deslumbrantes que vemos nas reportagens das revistas de surfe é estarrecedor.
As belíssimas Kauai e Maui tem um dos mais altos índices de suicídio entre os jovens em todo o Estados Unidos.
Aparentemente, os jovens se aborrecem facilmente nas ilhas e na falta do que fazer arrebentam os miolos com a arma do pai para passar o tempo.
É como se a beleza fosse tão imensa, que se torna insuportável.
O papinho de passar a vida balançando numa rede, debaixo do coqueiro, sombra, vida mansa e ondas sensacionais logo em frente é uma impossibilidade para a maioria do mortais por um motivo simples, nos habituamos com nossa rotina e dela não largamos.
Ou melhor, largamos sim, uma ou duas vezes por ano, e voltamos cheios de saudades para casa.
E a cada saída, chamemos fuga, e a cada fuga, nos alimentamos um pouco mais da ilusão de que poderíamos ser felizes sozinhos nessas ilhas dos sonhos.
As ilhas são os próprios sonhos, os sonhos com hora marcada, aqueles que planejamos e cumprimos.
E nós sabemos que os sonhos não funcionam assim.
A ilha é tudo que não podemos ser e tudo que não queremos acreditar.
A melodiosa solidão do surfista que desejou surfar sozinho por toda vida e dava tudo pra ter um dos amigos ao seu lado naquele momento.
No meu caso, a ilha é sempre uma lembrança meio fugaz, que parece uma fantasia que nunca vivi de verdade, algo como uma viagem de LSD - apesar de ainda não ter experimentado o LSD...
Como no ano passado, quando fui às Maldivas e surfei sozinho no melhor dia da viagem, na melhor hora do mar.
Aquilo era bom demais pra ser verdade e lá estava eu, realizando um velho sonho, água transparente, quentinha, ondas com tamanho suficiente para divertir sem assustar.
Foram duas horas até chegar o primeiro companheiro e assim que ele chegou, fui embora.
Ao voltar pro Brasil, tive enorme dificuldade de contar pros amigos aquela situação. Não fui capaz de descrever nada, exceto os dias lotados de israelenses, brasileiros e portugueses.
Eu mesmo não estava certo do que tinha acontecido, duvidava das minhas lembranças, era urgente mergulhar na fantasia novamente.
De volta pro isolamento, pra solidão.

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